Começo pela resposta: porque estamos a falar de Pessoas – dos seus sentimentos e dos seus relacionamentos. Sempre que falamos de Pessoas falamos de emoções, de sentimentos, de empatia, de ligação. Somos seres sociais, e como tal precisamos deste “contexto” humano – valorizamo-lo a ponto de ele definir tantas e tantas decisões no nosso dia-a-dia, na nossa vida. É, pois, também uma questão de temperamentos, de atitudes, de personalidades – não são indiferentes, são aliás decisivos!
Ricardo Costa e Simon Sinek, por exemplo, também o defendem, quando referem que “as empresas são as Pessoas” e que “se os Clientes são Pessoas, se os colaboradores são Pessoas, líderes que não saibam tratar de Pessoas não percebem nada do seu negócio”…Pessoas!
Por que razão gostamos de ir sempre ao mesmo restaurante, cortamos o cabelo no mesmo cabeleireiro, recorremos ao mesmo médico, arranjamos o carro na mesma oficina, gostamos de ser atendidos sempre pela mesma pessoa no Banco, no Supermercado, na Farmácia? Pessoas! Em boa verdade, até a forma como escolhemos os nossos Amigos, as Pessoas que decidimos seguir nas redes sociais, a rádio que ouvimos, os programas de televisão a que assistimos, tudo assenta em Pessoas!
Ricardo Caldeira, Leadermotionalist
A forma como nos tratam, a forma como nos fazem sentir, os sentimentos que despertam em nós, a empatia que se gera, a atenção que nos dedicam, a influência que canalizam na nossa direcção!
Em Indústrias, como a maioria das actuais, em que o produto vendido ou o serviço prestado é o mesmo, ou parecido, em que os preços não diferem grandemente, em que os processos de I&D são equivalentes, em que a disrupção é difícil ou, quando acontece, rapidamente é imitada, de que forma podem os seus players diferenciar-se dos demais? Qual a razão para qualquer Cliente ou consumidor optar por um dos players em detrimento dos restantes? Mais uma vez, as Pessoas!
As Pessoas e a Liderança
Na lógica organizacional funciona do mesmo modo. Com a Liderança, mas também entre pares. Em todo o lado há Pessoas com quem desejamos trabalhar e outras das quais fugimos. Novamente, Pessoas. Pelo que são e pelo que entregam. Pelo que nos fazem ser e entregar.
De quem nos lembramos com mais saudosismo? Aqueles que nos proporcionaram grandes momentos, que nos ajudaram a crescer, que viveram e sentiram connosco, ou aqueles “bullies” que nos aterrorizaram ou que nos utilizaram como meio para atingir os seus fins – aqueles para quem somos meros peões nos seus jogos de xadrez? Não o devendo ser, acredito que a resposta a esta questão não seja imediata, porque infelizmente, muitas vezes, de quem nos lembramos mais imediatamente é destes últimos – neste caso, naturalmente, pelas piores razões (mas lá está, de novo, e sempre, as Pessoas).
Há também Pessoas com quem simpatizamos mesmo sem as conhecer, só pela forma como falam, como escrevem, como se apresentam. Outras há que nem mesmo com o cada vez maior conhecimento que delas vamos tendo conseguem merecer qualquer interesse. Há quem lidere sem ser líder e quem seja líder e não lidere… Pessoas!
Nas relações profissionais, nas ligações líder-liderado, isto é ainda mais verdade e revela-se muito mais decisivo. É já um cliché dizer-se que “as Pessoas estão saturadas de chefes, querem verdadeiros líderes”, pois estes são diferentes, são mais humanos e vão (ainda) sendo raros.
A humanização das lideranças
Sou um acérrimo defensor de uma maior humanização das Lideranças – e mais ainda de que se tragam emoções para esta esfera. As Pessoas querem e têm de se sentir valorizadas e queridas. Líderes que o fazem, de forma genuína, são líderes que, natural e rapidamente, se impõem e granjeiam admiração. São os Cisnes Negros da Liderança e quando falo deles é a este tipo de líderes e de relações que me refiro – os emocionais. Comunicação, empatia, cuidado e atenção individualizados (como sempre digo, a questão não é tanto tratar ninguém de forma diferente, é mais não tratar todos de maneira igual), humildade, disponibilidade para arriscar (correndo o risco de errar), para ser/fazer diferente, para altruísmos diversos. Emocionalmente inteligentes e inteligentemente emocionais!
Quando este tipo de relação se estabelece, as Pessoas (o Capital Emocional das Organizações, no pensamento de Martyn Newman) estão mais satisfeitas e felizes. A produtividade dispara. Os resultados são melhores. Os fenómenos de saúde mental perdem expressão, propiciando o crescimento da Segurança Psicológica. Como na vida, sempre que estamos bem conseguimos ser mais vezes a nossa melhor versão, sermos nós próprios! Somos os melhores preparados de sempre, mas continuamos “robotizados” como sempre!
Este é o garante da conectividade e comprometimento que as Organizações tanto anseiam das suas Pessoas, e a salvaguarda de que o talento por ali se manterá. Sem algo que as ligue, sem esta cola, podem gerar-se fenómenos, que chegam a ganhar proporções desmesuradas, como aqueles que experienciámos nos últimos anos – o “Quiet Quitting” (cuja causa é uma recorrente “Noisy Leadership”) e a “Great Resignation” (teve como base uma habitual “Little Consideration“).
Neste contexto, o ser emocional, para lá da Inteligência Emocional, passa sobretudo por ter Agilidade, Plasticidade e Maturidade Emocional. Não são só as emoções em abstracto, é a sua gestão como a qualquer outra ferramenta de trabalho – (re)conhecê-las, interpretá-las, geri-las e utilizá-las.
“Pygmallion Effect” na Liderança
Está a fazer falta à Liderança uma espécie de “Pygmallion Effect”. O “Pygmallion Effect”, só para recordar, é o fenómeno que descreve como as expectativas podem modelar comportamentos — quanto maiores as expectativas existentes relativamente a uma determinada pessoa, melhor irá ser o seu desempenho – o mesmo sucedendo no sentido inverso.
Reza a lenda que a sua origem estará relacionada com a história de Pigmalião, um rei da Ilha do Chipre que era também um habilidoso escultor. Na tentativa de reproduzir a mulher dos seus sonhos, dotada de muitos dos atributos que o encantavam, esculpiu “Galatea”. Tanta foi a dedicação, empenho e amor que colocou, diariamente, na construção desta estátua que se apaixonou por ela. A história não passou despercebida à deusa Afrodite (deusa do amor e da beleza), que, como forma de recompensar Pigmalião, acabou por dar vida a “Galatea”.
Acredito, por experiência própria, que os líderes podem (e devem) ter este papel, este tipo de influência junto dos seus liderados – grandes expectativas, comunicadas, bem geridas, podem transformar-se em realidade. Oxalá fosse possível também aos liderados este poder de “tornar” real o tipo de líder que se idealiza – o dito “Effect”, na Liderança…
Sinónimo de liderar não é conseguir ter Pessoas a obedecer, mas sim ter corações a seguir!
Publicado na Talent Magazine, Fevereiro 2023